Ao lado
do pioneiro Ford Mustang e do Dodge Challenger, o Chevrolet Camaro faz parte da
santíssima trindade dos pony
cars, que é como alguns costumam chamar os muscle cars
relativamente compactos, baratos, potentes e estilosos que definiram a cultura
automotiva americana nos anos 1960 e 1970.
Assim como o Mustang, o Camaro foi um dos únicos muscle cars que,
ao longo de toda a sua existência, jamais deixaram de oferecer versões
equipadas com motores V8 – ainda que, em tempos de crise do petróleo,
estes fossem bastante estrangulados para economizar combustível. Sem dúvida,
esta demonstração de fidelidade às raízes ajudou o Camaro a se tornar um ícone
com reputação firme entre seus fãs.
Mas esta não foi a única coisa: o Camaro também conquistou pelo
design. E neste quesito, ao contrário do Mustang – que teve uma desastrosa
segunda geração, perdendo a essência e as versões de alto desempenho –, o
Camaro sempre fez questão de se manter fiel às origens, mesmo quando não
parecia. Para provar este ponto, a Chevrolet chamou alguns de seus
designers – que contribuíram para dar ao Camaro a cara que ele teve em
cada uma de suas gerações – para analisar, separadamente, cada uma das
gerações (em anos específicos) e apontar semelhanças e diferenças entre elas. É
uma verdadeira aula de design e sobre o estilo do pony/muscle engravatado
Primeira geração: Mustang fighter
A
Chevrolet nunca escondeu que o primeiro Camaro foi um carro feito às pressas. O
Mustang fez sucesso entre os baby
boomers – os jovens nascidos no pós-Guerra, que estavam
com vinte-e-poucos anos e tinham dinheiro para gastar graças ao crescimento
econômico que aconteceu de meados dos anos 1950 ao fim dos anos 1960. A
GM precisava de um concorrente à altura, e rápido.
O Camaro foi concebido às pressas, aproveitando uma
plataforma já existente – a do Chevrolet Nova – e a própria GM
admite que este foi um risco muito alto. O Camaro poderia ter sido um fracasso.
A plataforma do Nova limitou
algumas proporções – especialmente a altura e o comprimento do
capô –, mas isto não impediu a equipe de design de empregar algumas
soluções bastante eficientes. Para ilustrar, a Chevrolet pegou como exemplo o
Camaro 1969. “
A ideia era fazer um carro compacto e esguio, porém que passasse a
impressão de ser largo e musculoso. Assim, o perfil “garrafa de Coca-Cola” foi
complementado por para-lamas traseiros salientes e ligeiramente mais altos
que o resto da carroceria. O painel traseiro tem lanternas retangulares e
largas, reforçando esta impressão quando o carro é visto por trás.
A
dianteira, por sua vez, formava um “bico” – segundo a Chevrolet, para
tornar a dianteira mais interessante –, que se tornou uma marca do design
do Camaro e foi incorporado, de diferentes maneiras, em todas as gerações,
enquanto o capô tinha um discreto scoop do tipo cowl inductionque, apesar
de funcional, também servia para deixar claro que, debaixo dele, estava um V8
de alto desempenho, fosse ele um small
block 350 ou, como
vimos na história do Camaro Yenko, um grande e potente big block de sete litros.
Outras características marcantes do Camaro 1969 eram os vincos que
percorriam as laterais e as entradas de ar falsas nos para-lamas
traseiros – recursos estilísticos que foram empregados na quinta geração,
de 2010.
Para
o atual vice-presidente do departamento de design da GM, Ed Welburn,
o fato de o Camaro de primeira geração não ter sido inspirado em nenhum outro
design foi o que o ajudou a ser tão marcante — a ponto de servir como
inspiração para a atual geração do modelo: “Ele era original e distinto. Não foi
inspirado em nenhum outro design e, isto o ajudou a manter o visual bonito e
atemporal.”
Mas o terceiro ano da primeira geração também foi o último: em
1970, o Camaro seria totalmente reformulado, e a segunda geração conseguiu ser
ainda mais original.
Segunda geração: uma nova identidade
“Foi uma
mudança radical em relação à primeira geração”, comenta Ken Parkinson, que
comanda o departamento de design de utilitários da GM a nível global. “A equipe
de design criou uma expressão poderosa do que é um muscle car americano, com
influências da estética dosgrand
tourers europeus.“
Esta influência fica clara ao observarmos que o Camaro II tem linhas mais suaves, capô mais longo, cabine recuada e traseira mais curta. A Chevrolet optou por linhas mais limpas, simples e elegantes, ao mesmo tempo em que não acabou com o espírito americano do design. A grade ficou mais larga e estreita, praticamente um retângulo entre os quatro faróis (como fica evidente no carro usado como exemplo, o Camaro Z28 RS 1970).
Uma das características mais marcantes do Camaro de segunda geração é o para-choque dianteiro dividido em duas peças nos modelos mais potentes, mas não é a única. Por exemplo: para deixar o carro mais musculoso sem repetir soluções empregadas no modelo anterior, em vez de tornar os para-lamas traseiros mais largos, a equipe decidiu aplicar uma curva para dentro na parte inferior da carroceria, deixando os pneus mais expostos e contribuindo para um stance mais agressivo e firmado no chão.
A traseira também ficou mais simples, com um caimento mais suave e, a partir de 1974, vidro traseiro envolvente. As lanternas agora eram quatro peças redondas, duas de cada lado – de desenho mais simples, elas complementavam o visual da traseira sem se tornarem o elemento principal.
A segunda geração do Camaro durou doze anos – de 1970 a 1981 – e, no meio do caminho, passou por uma reestilização bastante dramática: a dianteira ficou mais longa e pronunciada e a traseira ganhou grandes lanternas retangulares, além do já citado vidro traseiro envolvente.
Era uma tendência na época e, à medida que a nova década de aproximava, abriu caminho para uma bem vinda reformulação total – ao menos do ponto de vista estético.
Terceira geração: a cara dos anos 80
Há apenas dois tipos de opinião sobre os anos 1980: há quem pense que eles foram a melhor década da história, e quem pense exatamente o contrário – curiosamente, pelos mesmos motivos. De qualquer forma, para o Camaro as coisas não iam bem, afinal os doze anos vivendo à base de reestilizações acabaram evidenciando a idade do projeto. Assim, o novo Camaro para a nova década era radicalmente diferente.
“A terceira geração do Camaro sempre será um símbolo cultural da década de 1980 porque seu visual incorporava todas as tendências culturais hi-tech da época”, comenta John Caparo, diretor executivo do departamento de design global da GM. “Ele também se tornou um esportivo mais sério e com isto, suas formas foram pensadas sobre uma estrutura projetada para um novo nível funcional”. Trocando em miúdos, mais do que nunca a carroceria deveria não só ser bonita, mas contribuir para o desempenho do Camaro.
Assim, a dianteira era mais baixa e em formato de cunha, para aumentar o downforce. Além disso, a influência dos grand tourers europeus desapareceu, dando lugar a um design totalmente americano e contemporâneo – algo que pode ser constatado quando se observa os instrumentos digitais e a tampa traseira tipo hatchback, algo inédito no Camaro mas muito popular nos anos 80. A Chevrolet dançou conforme a música e criou um Camaro futurista — ou ao menos o que, na época, seria chamado como tal.
De qualquer forma, o foco aqui é o design, e há inúmeras marcas de estilo que fazem o Camaro de terceira geração merecer ser chamado de futurista. Para começar, ele foi um dos primeiros carros americanos produzidos em massa a usar seus elementos aerodinâmicos para melhorar o desempenho, como os carros de competição.
O vidro traseiro curvo que tomava quase toda a área da tampa do porta-malas também era um grande avanço tecnológico, enquanto as grandes lanterias traseiras tricolores deixavam claro que o Camaro havia mudado mesmo. Um discreto aceno ao passado, porém, estava presente na dianteira, que continuou com um “bico”, ainda que bem mais discreto.
Havia gente de dentro da própria Chevrolet que achava que o design era radical demais. A ousadia, porém, deu certo: em 1982, o novo Camaro Z28 foi eleito o carro do ano pela revista Motor Trend — mesmo com um V8 de cinco litros com carburador de corpo quádruplo e… apenas 145 cv. Mesmo assim, quando se fala em “Camaro clássico”, é esta geração que vem à mente junto com o modelo original dos anos 1960.
Quarta geração: a evolução do conceito

A impressão que temos ao olhar o Camaro de quarta geração — especialmente o modelo escolhido pela Chevrolet para realizar sua análise de estilo, o Z28 de 1996 —, é que a equipe de design pegou todas as linhas retas da geração anterior e as transformou em curvas. É mais ou menos como se o chefe tivesse dito “Ok, caras. Vocês já perceberam que os anos 1980 acabaram e a onda agora são as linhas arredondadas. Curvas, sacaram? Então deem um jeito nisso e façam um Camaro arredondado”.
É só prestar atenção nas proporções, nos faróis os elementos internos são praticamente idênticos, apesar da mudança na forma das molduras), no vidro traseiro curvo e no perfil baixo e aerodinâmico. Contudo, há diversos detalhes que fizeram a quarta geração envelhecer melhor que a terceira.
“Mais de 20 anos depois do lançamento, a quarta geração do Camaro ainda é tão bonita quanto qualquer outro carro nos showrooms das concessionárias de hoje em dia”, comenta Kirk Bennion, diretor de design responsável pela carroceria do Camaro. “Ele era muito agressivo, que tinha a intemção de desenvolver as proporções da terceira geração com um visual mais provocativo e desempenho aerodinâmico ainda melhor.”
Pudera: o novo Camaro tinha um para-brisa inclinado em 68º, que parecia formar uma linha contínua com o capô. Além disso, o scoop se projetava para a frente, formando uma linha contínua com o bico do carro. E se você está procurando a grade do radiador, saiba que ele não tinha: o ar era direcionado ao radiador por baixo da dianteira, e resfriava o líquido de arrefecimento com a ajuda de dois ventiladores.
É um dos maiores clichês de todos os tempos, mas na época ainda não era: a ideia era dar ao carro um formato de cunha que “passasse a impressão de que o carro estava andando rápido mesmo quando parado” — especialmente quando analisado em conjunto com a linha ascendente da traseira, que ganhou um spoiler curvo projetado após diversas sessões em um túnel de vento. As rodas de 17 polegadas também foram as maiores já usadas no Camaro até então.
Quinta geração: de volta às raízes

Em 2010, o Camaro voltou a fazer parte da linha da Chevrolet depois de um hiato de oito anos. Novamente, foi uma reação ao Mustang que, em 2005, inaugurou a tendência dos muscle cars retrô (e, curiosamente a abandonou em 2015).
Segundo Tom Peters, que dirigiu a equie que projetou a quinta geração, apesar de ser um carro inspirado em outro já existente, não foi um trabalho fácil capturar a essência do Camaro 1969 para usá-la em um carro moderno e totalmente novo. “O design final conseguiu ficar exatamente em cima da linha fina entre o retrô e o moderno”, diz Peters. A Chevrolet escolheu a versão de antes da reestilização realizada em 2013, que é a mais fiel ao modelo de 1969, para destacar os pontos-chave do design da quinta geração: a grade em forma de bico, as “guelras” na traseira e as lanternas divididas em duas seções retangulares.
A traseira mais larga e musculosa e o capô com o scoop do tipo cowl induction também se fazem presentes, mas as proporções tornaram a área envidraçada mais estreita na lateral (para alguns, exageradamente).
Se a quinta geração fosse a última, poderíamos dizer que o Camaro de quinta geração fechou um ciclo. Contudo, cinco anos depois, a Chevrolet já prepara um Camaro totalmente novo – e, se os flagras recentes indicam alguma coisa, a sexta geração deverá continuar seguindo a linha retrô.
Como ele se sairá diante da concorrência renovada? Esta é uma pergunta que só será respondida em um futuro próximo